domingo, dezembro 13, 2009

Ficção Intitulada

Ao olhar por um instante para o céu, notou o que nunca antes parara para pensar e deu por falta da luminosidade tenra de uma estrela conhecida. Era normal que vibrasse e fraquejasse e que por vezes parasse e voltasse, desde que sempre estivesse lá. Mas naquele momento, sabe-se lá por que, o que deveria estar lá não estava. Não havia estrela alguma, apenas o temor até então desconhecido de que ela nunca mais voltasse.

Jack lembrou-se de que toda a subjetividade tem um preço, que quando olhamos tempo demais para dentro de nós não vemos o que está a mais de um palmo do nosso umbigo. Sempre “soube” que as estrelas morriam, mas nunca em sua vidinha miserável imaginou que veria isso acontecer. No entanto lá estava ele diante do fato, extremamente surpreso e um tanto quanto envergonhado de por tanto tempo ter sentido a necessidade de saber que alguém um dia lançou daquela estrela um olhar de volta para ele.

Olhou de novo para o céu, e de novo, e de novo, sabendo que já ocorrera antes de ter apenas perdido a estrela de vista e se confundido, visto que era apenas um amador na arte de observar estrelas. Mas sabia que até então ela não estava lá e talvez amanhã não estivesse, nem depois de amanhã e nem depois de depois de amanhã. E por mais que doesse não havia nada que pudesse fazer a não ser esperar.

Enquanto fitava o horizonte aturdido, lembrou-se de que quando era criança acreditava que as estrelas existiam uma por causa das outras. Que de cada estrela brotavam várias outras e destas muitas outras ainda, numa profusão caótica, amistosa e infinita. Até que um dia, ao compartilhar com cortesia sua pequena sabedoria a um adulto, recebera de volta uma risada curta, rude e sarcástica e uma pergunta capciosa. “Então, se as estrelas nascem umas das outras, de quem nasceu a primeira estrela?”

Diante do enunciado o pequeno Jack não teve outra opção senão sorrir sem graça e corar. Conteve o choro enfurecido e orgulhoso até conseguir se encontrar só e então verteu todas as lágrimas que pode, não pela grosseria recebida, nem pela certeza que lhe havia sido arrancada, mas pela necessidade do homem em destruir tudo pela “lógica”. No fundo ele sempre soube que não era aquela a resposta para o brilho da noite, mas nunca entendeu o prazer mórbido do homem em destruir coisas belas fingindo ignorar o que estava para além de si próprio.

Naquela noite Jack não conseguiu dormir, ficou esperando a estrela até que a aurora não o deixasse mais distinguir entre os astros e céu. E sem saber se a estrela havia morrido ou não, o amargor de tornar-se consciente de que estrelas morriam todos os dias só era superado pelo amargor de saber ter herdado a ignorância que o tornava impotente e cúmplice de um fato tão sórdido quanto a morte de uma estrela.