sábado, maio 14, 2011

Fôlego

O impacto gelado golpeou cada milímetro do seu corpo, arrebatando-lhe, suprimindo-lhe os sentidos... estava só, tentava ver, mas a luz tremeluzente e fraca pregava-lhe peças. Insistia, descia mais e mais fundo, o que começava a render-lhe estalidos fracos em seus ouvidos, estalidos que por mais fracos que começassem, sempre o assustavam tanto quanto quando tornavam-se fortes estrondos. Logo o ar faltava, o peito reclamava e ele continuava a procurar com o mesmo desespero que buscaria uma bolha de ar. Para então, levado ao limite, voltar a superfície. Agora começava a se acostumar a temperatura e não mais assustava com o impacto do frio. Seu corpo logo seria um com a água e o frio não mais importaria, ainda que soubesse estar fora de seu ambiente.

Mergulhou mais uma vez e outra, e outra, e outra. Mergulhou até parar de sentir seus dedos. Mergulhou até não conseguir contar. Mergulhou até que toda a sua pele enrugasse. Muito. E continuava mergulhando confuso, sem saber o que via ou deixava de ver. Às vezes pensava ter visto algo. Às vezes encontrava de fato e chegava a ter a certeza de ter tocado sua calda, apenas para perdê-la no instante seguinte junto as suas certezas. E era tragado de volta à superfície por sua incapacidade de permanecer lá, mas a sensação que se seguia era, não a do fôlego recuperado, e sim a da total perda do ar.

E continuou ali a tentar, muito tempo depois de o sol se por e as estrelas nascerem. Muito tempo depois de o frio abrir-lhe feridas que escureciam a água ao seu redor. Continuou sem saber de nada, numa ciência imprecisa, numa arte perdida ou talvez nunca adquirida. Continuou sem saber que havia na verdade se deixado apaixonar pela morte.

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