Acordo para uma manhã branca. Os raios frios entram pelas frestas que o tempo abriu na janela. O teto se inclina em minha direção curvado pelo peso dos cupins e o tempo breve prenuncia mudanças. Está cedo de verdade, não aquele o cedo de todos os dias e todas as horas, o cedo do incerto, está cedo de verdade. O sono deixa a cama com pressa e vilania e eu já nem insisto que ele fique, mas levo alguns minutos para me dar conta de mim mesmo e da partida de um amigo.
Ele não foi embora ontem, já havia partido há uns cinco anos, ou talvez eu que partira então. Ainda assim é amargo acordar em um mundo arbitrário. Talvez eu nunca mais o visse mesmo que ele continuasse vivo, mas agora... Agora tudo o que faço é me lembrar dos ritos fúnebres e dos rostos de inúmeros desconhecidos, enquanto percebo o quanto já me esqueci dos rostos que nós conhecíamos e que não estavam lá. Como se houvesse calor num abraço hipócrita de quem teme a ave de rapina. Como se nossa carne não estivesse igualmente rota e carcomida porque ainda respiramos. E me assustei. Não por medo de sua sombra ou pelo toque de suas penas, nem pelo vazio deixado por quem nunca esteve ao meu lado, mas por perceber o quanto eu também já esqueci de mim mesmo.
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