terça-feira, dezembro 21, 2004

Semi-existência

Escrito ontem pela manhã.

Batidas descompassadas, coração acelerado, falta fôlego, água, frio, incômodo. Estou na cama. Viro de um lado para outro, quase me debato, não encontro posição confortável. Ora um calor insuportável, ora um frio desagradável e ninguém a meu lado. Meu corpo dói. Meu cérebro pulsa, resiste a acordar, não quer voltar a dormir. Permaneço prostrado, cansado, vazio, desalentado e com um sono insuportável. Levanto de súbito, me visto tão rápido que não entendo como. Silêncio. Todos foram embora. Que estou fazendo eu sozinho? Não me lembro do meu nome, olho no espelho e não me reconheço. Na mesa permanece o desjejum, frio já há algum tempo. Bebo leite. Olho em volta, uma brisa gelada constante arrepia a pele. Saio à rua e os olhos passam por mim sem me notar, olhos vazios, esbranquiçados, olhos de mortos. Vez que outra um olhar parece me acompanhar, parece me reconhecer, depois desiste, ignora-me. Não sei, parece que sou outro, torto, não valho a pena, e meus olhos talvez sejam de um morto, ou estejam se tornando. Desisto, vou trabalhar. O sono me devora, não consigo acompanhar as letras no monitor, para onde elas foram? Fugiram, correram pela sala. Fico perseguindo as letras, os olhos, o sono. Numa sala vazia, sempre vazia, onde os anos passam e eu envelheço mais e mais sozinho. Mas nunca morro. Talvez já esteja morto a algum tempo e por isso não viva. Aparentemente voltei a acordar, olho ao redor desconfiado, um mosquito disputa a minha atenção com o monitor. Parece que ele consegue me ver, desvia dos meus movimentos. Fico imaginando se o mesmo acontece com as pessoas, se não vou passar através delas e sentir muito frio. É impossível explicar, é ilógico, é tortuoso. Começo a falar e percebo que converso sozinho, do outro lado do tabuleiro de xadrez não há ninguém. Chá para dois, três, seis, mas uma xícara só se esvazia em quanto as outras esfriam. Meu coração dói e eu não consigo saber por que, não há o que eu faça, não há o que eu fale nem o que escreva nem o que grite. Os dias vão perdendo as cores e as rosas secam no armário.

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