domingo, agosto 21, 2005

Vômito

Então eu tento fechar a minha cabeça para que as idéias não escapem, não fujam ou se misturem com as outras coisas ao meu redor. Como se todas as coisas no meu quarto fossem pintadas em tinta a óleo e a qualquer momento que eu toque ou olhe para qualquer coisa isso possa se misturar as minhas idéias. Não quero, ou melhor, não posso, não agora pelo menos. Tenho algo importante a pensar, a escrever. Digito olhando para o teclado para não ver absolutamente nada ao meu redor que possa me desconcentrar.
Tudo começou ontem à noite. Fui a uma festa de noivado muito legal de uma amiga minha da faculdade, que me arrependo de não ter conhecido antes, assim como a todas as pessoas com quem atualmente eu falo por lá. É como se depois de todos esses anos o curso tivesse separado o joio do trigo e agora eu possa encontrar pessoas que são como eu. Isso é adorável, embora não queira dizer necessariamente algo além disso. São pessoas como eu sou, nem melhores, nem piores do que as outras pessoas. Na vida carecemos ter pessoas diferentes assim como carecemos ter pessoas minimamente parecidas conosco. Mas às vezes o manto da igualdade esconde diferenças estarrecedoras. Enfim, o meu leitor que me perdoe o raciocínio tortuoso, é que quando passamos por um período de estiagem criativa, nós escritores, temos acessos nos quais vomitamos todas as idéias que nos vêm à mente, tudo o que pensamos, tudo o que sentimos; acessos que queremos, desejamos, precisamos grafar de qualquer modo. Para mim, hoje é um desses dias.
Como eu ia dizendo, ontem fui a essa festa em uma tradicional balada rock n’ roll paulistana. E sob a sensação hospitaleira da fraternidade não consegui evitar me sentir um pouco deslocado por estar entre várias pessoas que conheço a pouco tempo. O que mais uma vez me obriga a interromper para pedir desculpas, pois o fato de serem novos amigos não os diminui de modo algum. A admiração mútua, o tratamento afável que se estabelece entre todos nós é de todo respeitoso e sincero, o que me comove bastante a despeito do fel. O fel é apenas um desconforto fútil que sinto, semelhante a começar um livro pelo seu último capítulo. Como assistir ao final de uma peça identificando-se a um Hamlet cuja paixão se desconhece. É o grito agonizante de alguma sinapse esquizóide em meu cérebro.
Não sei se vocês compreendem o que tento falar, entendo que as sucessivas interrupções narrativas a que eu vos submeto evidênciam o tão pernicioso assunto. Eu falo sobre o medo. Maldito medo que me persegue noites a fio, sombra longilínea que se estende a partir dos meus pés. Queria entender quem me infundiu todo esse medo. Quem... Eu mesmo talvez, tendo me submetido a meia dúzia de relações espúrias que me fizeram apenas mal. Agora eu medro toda vez que recebo um olhar afetuoso, esperando um golpe de chave inglesa por cada sorriso. Não compreendo a mim mesmo. Tenho, às vezes alguns delírios de entendimento, pálidas idéias que não conseguem refletir a realidade. Realidade... E o que é a realidade senão um status mórbido criado por cada um de nós para convenientemente simular o meio e justificar aos nossos atos, a nós e aos nossos imensos umbigos.

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